Era uma noite fria, a lua cheia brilhava,
lançando estreitos filetes de luz por entre as falhas do telhado, não havia
muito, paredes de pedra de um quarto quase vazio, uma cama com dossel
empoeirada, uma penteadeira de madeira escurecida pelo tempo, com o espelho
quebrado, eu o olhava, mas o reflexo que se desvanecia sobe as camadas de pó,
não passava de uma sombra, um vulto, o vento soprava forte, e a janela batia, e
através dela os uivos do vento me chamavam, como um sussurro que resvalava
dentro do peito, me guiando para o brilho prateado da noite lá fora, e pela
janela via um campo de capim cor de bronze que dançava a mercê da brisa
tempestuosa, uma orla de altas arvores tinham seus galhos meio verdes meio ocre e âmbar açoitados pelo
vento.
Não sei ao
certo quanto tempo fiquei olhando os padrões se desenrolarem no capim, na
verdade não sabia á quanto tempo estava ali,
aquele lugar desolado e sombrio, parecia sugar o que restava de
conciencia, mas em algum momento, passos que vinham pela porta me despertaram
novamente, passos leves e suaves, quase imperceptíveis, a não ser pelo ranger
das taboas do piso e o estalar dos pregos enquanto o caminhar continuava,
tornando-se mais altos, mas próximos, mais reais, e meu coração martelava, a
cada passo que ouvia, pois aqui o tempo não passava, aqui não havia nada e por
aquele segundo apenas vi das sombras surgir o reflexo de sonhos perdidos e
desesperados.
A porta se
abriu, uma mulher estava do outro lado do portal, seu rosto encoberto pelas
sombras com longos cachos cascateando por sobre os ombros, olhos de um castanho
esverdeado que faiscavam, captavam e refletiam milhões de vezes a luz prateada
da lua, era a única coisa que via no breu. Não fazia idéia de que era ela, mas
já há vi antes, seus olhos ao menos, tinha certeza de ser invisível, eu não
estava ali, não podia estar, e essa certeza
fez como que meus olhos se fixassem nos dela, um longo segundo se
passou, um segundo que pareceu se arrastar docemente enquanto a encarava, buscava registrar cada detalhe que a
envolvia, um vestido longo que se perdia na semi escuridão, cobria dês de o
colo aos pés, mangas longas ate os punhos cobriam seus braços, a garota , quem
quer que fosse, deu um passo me trazendo de volta do exame detalhado, aos
poucos a certeza de que ela não me via se esvaia, os olhos de matizes castanho
esverdeados queimavam meu rosto,olhando para mim, ela me via,e mesmo o som do
vento que uivava na noite desapareceu abafado pelas batidas que enchiam meu
peito..
Durante todo
o tempo que estive aqui senti como se não existisse, não havia nada, nem a
menor sensação, tudo era escuro e vazio, como se eu mesmo não passasse de uma
sombra um eco, talvez uma recordação, mas naquele momento o vazio o vácuo foi
preenchido com os matizes da aurora,
naqueles olhos... que me viam, seus dedos se entrelaçaram nos meus, antes mesmo
que pudesse reagir, trazendo-me a consciência de meu próprio corpo, seu calor
afastando o frio que os tornará dormente,
morto, e seu aperto fechou-se em minha mão como se fosse sua segurança, como se
precisasse ter certeza de que não estava só, e seu toque me despertou dos
devaneios e da incerteza.
Seu peito
subia e descia, me fazendo tomar consciência agora de seu próprio corpo, e o
senti se aproximando cada vez mais do meu, seu rosto estava baixo escondendo de
mim seus olhos, contra meu peito, e quando senti seu toque foi como se
precisasse sentir as batidas do meu coração, sua respiração de encontro a uma
fina camisa que usava, e seus olhos tomaram os meus, uma mistura quase mística
de cores, uma profusão de castanho,
âmbar e verde luminoso, seu nariz afilado e pequeno, frágil, as maçãs do rosto
e os lábios finos que se curvaram num sorriso doce que tinha como moldura
longos cachos castanhos dourados que caiam sobre os ombros e desciam pelas
costas .
A mão livre,
fez o caminho da minha cintura subindo pelo meu peito temerosa, assustada,
desconfiada ate se firmar em meu ombro, eu... eu não suportei, a envolvi em meu
abraço, e fui correspondido quando seus braços se fecharam em torno de meu pescoço, se segurando com se sua vida dependesse
disso.
Seus lábios
alcançaram os meus num beijo terno, cálido e detido, senti seu peito subir e
descer de encontro ao meu, e o que era terno tornou-se ávido, o que era cálido
tornou-se desesperado e o que era detido, livre, seus braços apertando-nos como
se pudéssemos fundir-nos, uma carne, uma alma.